São cada vez mais numerosos os que, entre nós, se confessam descrentes. Mas, se observarmos mais de perto sua postura, talvez tenhamos que dizer que sua incredulidade não é tanto fruto de uma decisão responsável quanto resultado de uma vida alienada e privada de interioridade.
Na vida de muitos contemporâneos faltam as condições mínimas para tomar uma postura séria e responsável diante da fé ou da descrença. Vive-se um modo de vida onde nem sequer aparece a necessidade de dar uma sentido último à existência. Como diz um ateu contemporâneo, "somos simplesmente nós que devemos dar um sentido à nossa vida, vivendo-a" (J. Jeanson).
Mas quando se vive buscando só um bem-estar material cada vez maior, unicamente interessado em "ter dinheiro" e "adquirir símbolos de prestígio", preocupado em ser "algo" e não em ser "alguém", perde-se a capacidade de escutar os apelos mais profundos que se encerram no ser humano.
Quem vive assim carece de ouvidos para qualquer rumor que não seja o que provém de seu mundo de interesses. Não tem olhos para perceber outras dimensões que não sejam as dom bem-estar material, da posse e do prestígio social. Como diria Max Weber, são pessoas que "carecem de ouvido para o religioso".
A parábola de Jesus (O festim de bodas - Mt 22, 1-14) nos faz lembrar, a todos nós, sempre de novo, que no fundo da vida há um convite para buscar a liberdade e a plenitude por outros caminhos. E nosso maior equívoco pode ser desatender levianamente o convite de Deus, indo cada um de nós para "nossas terras e nossos negócios".
Vamos continuar fugindo de nós mesmos, perdendo-nos em mil formas de evasão, tratando de esquecer a Deus e evitando cuidadosamente tomar a sério a vida. Mas o convite não cessa. No fundo de muitas posturas de descrença, será que não se esconde um medo de mudança, uma mudança que necessariamente deveria operar-se em nossa vida se tomássemos Deus a sério?
Sem dúvida, uma grande verdade se encerra na oração de São João da Cruz: "Senhor, meu Deus, Tu não és estranho para quem não se estranha contigo. Como dizem que tu te ausentas?"
José Antônio Pagola no livro "O caminho aberto por Jesus - Mateus", capítulo 32, intitulado "O convite de Deus".
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