Romeu de Campos Vergal (02/5/1903-2/7/1980) foi um dos
espíritas mais atuantes no Estado de São Paulo, tendo sido Deputado
Estadual (1935-1937) e Federal em várias Legislaturas, de 1946 a 1970.
Político e espírita intimorato, ingressou bastante jovem no Espiritismo,
participando de vários movimentos de propaganda da Doutrina,
principalmente como privilegiado orador.
Em data exata
que não conseguimos precisar, provavelmente entre 1950 e 1955, Campos
Vergal, acompanhado de outros confrades, esteve em Pedro Leopoldo
visitando Chico Xavier e recebeu esta mensagem, certamente ligada a seu
trabalho de legislador, no qual deveria estar empenhado em alguma causa
favorável à condição das mulheres. A sabedoria contida nas palavras de
Emmanuel convida-nos a meditar o assunto.
Meus amigos, muita paz.
Espiritismo, em verdade,
não é um sistema de promessas para a beatitude celestial. É realização
do Bem, do Céu na Terra, serviço libertador de consciências e corações
para hoje, aqui e agora. Congregados na mesma edificação, sentimo-nos felizes identificando-lhes o
sadio propósito de concretizar os ideais divinos, no círculo das
experiências humanas. Nossa fé, em tempo algum, deve circunscrever-se ao incenso adorativo,
porquanto, em substância, é luta digna por um mundo melhor e por
criaturas mais felizes, estendendo-se de nossas convicções mais íntimas
aos nossos atos mais insignificantes. E por relacionarmos semelhantes imperativos dos princípios redentores
que nos irmanam, cabe-nos o prazer de insistir com o nosso irmão Romeu
Campos Vergal, que partilha conosco esta meta de espiritualidade no
sentido de preservar em sua expressiva tarefa junto da mente feminina, à
luz do Espiritismo santificante.
Permanecemos à frente de
um mundo necessitado e o campo de serviço requisita compreensão e
atividade sem tréguas em benefício da paz. A política internacional não
modificou seus quadros de luta, e o espírito de hegemonia domina,
infelizmente, os que governam, quase tanto quanto há dois mil anos, em
que a sociedade humana se dividia entre os dominadores possíveis de hoje
e as vítimas prováveis de amanhã, nos incessantes espetáculos de ruína e
de sangue.
Não obstante os
entendimentos diplomáticos e, apesar da mensagem respeitável dos
pensadores dignos, a dolorosa realidade não pode ocultar-se aos mais
avisados de raciocínio. De armas ensarilhadas, tão somente, legiões
compactas organizam-se vagarosamente para novos embates. Como cogitar
uma paz duradoura sem as bases da concórdia espiritual? Em que alicerces pavimentar os programas da ordem se a revolta domina,
se a insegurança prevalece, se a desesperação campeia em todos os
climas? Impossível arregimentar elementos para o edifício da cooperação
mundial, embora nosso dever é de respeito a todas as organizações
veneráveis que objetivem a união da família humana, sem a construção da
paz espiritual, fruto espontâneo do entendimento superior do homem no
campo da vida.
Defrontados por tremenda
crise de caráter em quase todas as regiões do globo, urge renovarmos o
roteiro da fé libertadora e esperança que nos reanime a consciência e
fortaleça o coração para consentimentos indispensáveis. Não julguem que
os desencarnados, de cuja sorte partilhamos, permaneçam a distância dos
enigmas que ensandecem a mentalidade do mundo. A morte não nos exonera
da responsabilidade perante a nossa realização, que é o Orbe Terrestre. Dividimos o serviço restaurador e velamos como todos, na marcha de
reajustamento compartilhando alegria e dores, expectativas e desenganos.
Leis eternas traçam-nos obrigações de reciprocidade nos círculos
evolutivos em que nos movimentamos e, ainda que o poder humano nos
desintegre a morada material que hoje lhes obriga a experiência
corpórea, nem por isso estaríamos libertos do dever que nos irmana uns
aos outros, em torno da ordem divina.
Cooperamos, assim, na
extensão do Espiritismo salvador, reconstruindo o santuário da crença
que os dogmas destruíram. Combatamos, em nós mesmos, a sombra do
exclusivismo, para que a universalidade nos enriqueça os sentimentos de
mais luz para a vida eterna.
E, nesse sentido, meu
amigo, socorrer a mulher, conferindo-lhe os poderes dignos de uma
destinação, na qualidade de doadora da vida, é esforço sagrado que as
forças divinas abençoarão em sua estrada de missionário consagrado ao
supremo Bem.
O pensamento
religioso é o curso da introdução à espiritualidade sublime. Em suas
classes numerosas, é possível organizar proveitosas portas reveladoras
da vida, a filosofia coordenar-nos-á os esforços, sincronizando-os
quando é necessário, mas a religião traçar-nos-á os caminhos verticais
de acesso aos suprimentos divinos. Lutemos, sim, contra as genuflexões,
trabalho digno pelo planeta redimido, mas conduzamos o coração feminino
aos mananciais dos recursos celestes, para que nossa compreensão
facilite a humanidade.
E não suponha que as
organizações do Mais Alto permaneçam distraídas de seu programa bendito
de fraternidade e de luz. Unidos ao seu esforço incansável, abnegados
companheiros da Esfera superior lhe acompanham a ação e regozijam-se com
a coragem e com a fé viva impressas em seu mandato espiritual.
Prossigamos
cooperando na doutrina que console e levante, que conforte e movimente a
vida, que abrace o sofredor e lhe indique serviço a fazer, que aponte o
Céu, mostrando, em seguida, as necessidades da Terra para solucioná-las
com amor e dedicação. Não fomos chamados pelo Supremo Poder para a crença inoperante e
exclusivista. À frente de nossos olhos, todos os quadros humanos, ainda
mesmo os mais deploráveis, constituem apelos ao serviço santificador. Em
todos os caminhos há levitas interessados em convenções e companheiros
que choram relegados à dificuldade ou ao abandono como o desventurado da
parábola. Os bons samaritanos, porém, são ainda raros e não haverá trabalho verdadeiramente salvacionista sem eles.
Que a sabedoria
divina nos conceda a graça de incorporarmo-nos à fileira reduzida, e que
nossas mãos não descansem no labor sublime do Bem. E que a sua palavra e
a sua ação, o seu ideal e a sua fé permaneçam constantemente, como vem
acontecendo a serviço da Terra melhor, é o desejo do amigo e servo
humilde.
Recebido por Francisco Cândido Xavier, recolhido e relatado por Eduardo Carvalho Monteiro, publicado no livro "Chico Xavier - Inédito", capítulo 19.