Físico quântico indiano Amit Goswami propõe a
conciliação entre a Ciência e a espiritualidade, e contribui para
validar conceitos da Psicologia como inconsciente
Por Marcelo Galli*
Por Marcelo Galli*
Publicado originalmente no Portal Ciência e Vida.
O físico quântico indiano Amit Goswami é referência mundial sobre a
conciliação entre a "Ciência Dura", mais especificamente a Física
Quântica, e a espiritualidade. A nova ciência que ele propõe, segundo o
próprio, está ajudando a Psicologia a se desenvolver ao contribuir para a
validação de conceitos usados internamente pela disciplina e que não
têm lastro científico.
"Na Psicologia está uma das maiores aplicações dessa nova
ciência", disse, em entrevista à Psique Ciência & Vida. "Pudemos
desde o começo explicar a distinção entre consciência e inconsciência e
isso deu um impulso para a Psicanálise, para as teorias de Jung, para a
Psicologia de forma geral, e definitivamente para a Psicologia
Transpessoal", explicou.
Na visão dele, que se tornou mundialmente conhecido ao
participar e expor suas ideias no filme Quem Somos Nós?, de 2005, o
Brasil é importante para o desenvolvimento do seu trabalho porque no
País as emoções ainda são valorizadas, diferente de muitos países
ocidentais, em que a racionalidade é superestimada e menospreza, tais
quais as experiências pessoais e profundas como a intuição. Segundo
Amit, o não reconhecimento da emoção é barreira, por exemplo, para se
lidar com as emoções negativas. "A economia montada no Ocidente, especialmente nos EUA, é um
exemplo de como emoções negativas podem ser dispensáveis, como a
ganância. Dessa maneira, fica claro que superestimar a racionalidade é
um erro".
Formado em Física Quântica pela Universidade de Calcutá, Índia,
Amit é professor emérito do Departamento de Física da Universidade de
Oregon, EUA. No Brasil já publicou os seguintes livros pela editora
Aleph: A Física da Alma, O Universo Autoconsciente, Criatividade
Quântica, Deus Não Está Morto, Evolução criativa das espécies, Médico
Quântico e a Janela visionária. O físico esteve recentemente no Brasil
divulgando mais um trabalho, O Ativista Quântico, em que ele volta a se
apoiar em princípios desse ramo da Física para apontar o potencial da
consciência e mostra como essa nova perspectiva pode influenciar a
mudança de valores da sociedade e ajudar as pessoas a viverem melhor.
Você acredita que a proposição do seu
trabalho, ou seja, a união entre ciência e espiritualidade, seja a
expressão de uma nova era que está por vir ou já está acontecendo?
Goswami: Sim, e
eu também acredito que dessa vez será uma permanente união porque a
Ciência agora é baseada em metafísica espiritual consciência é a base de
todo ser graças à Física Quântica. Essa é uma era de integração em
geral, especificamente entre a Ciência e a espiritualidade. Esse
movimento já acontece em alguma medida, mas tanto na comunidade
científica quanto na religiosa há muita inércia. O movimento é lento,
mas está tomando forma, podemos esperar muitas mudanças nas próximas
décadas.
Qual é o motivo dessa inércia?
Goswami: Existem
muitos interesses ocultos. O ponto é que a Ciência teve problemas
filosóficos, paradoxos, por décadas. Mesmo quando a Física Quântica
apareceu, em 1925, naquela época as pessoas que eram filosoficamente
orientadas souberam que a Ciência Clássica materialista não funcionava.
Fomos adiante, resolvemos paradoxos, não há questão no espírito da
Ciência que possa resistir, mas há muito dinheiro envolvido, as pessoas
vivem disso. Demora um tempo para cederem, como a Igreja não cedeu
sobre Galileu ou Newton e manteve sua posição por muito tempo.
Algumas teorias do físico alemão Werner Heisenberg seguem a mesma direção das suas proposições, não?
Goswami: Ele foi
o primeiro a sugerir que a consciência é importante na mudança de
possibilidades quânticas na realidade. Ele disse que o colapso do
evento, nome técnico para a mudança da possibilidade na realidade, é uma
mudança do nosso conhecimento. O que é o nosso conhecimento? É o que
chamamos de consciência, é saber. Ele estava consciente de que a nossa
consciência envolve todas as possibilidades de mudanças na realidade.
Qual é a explicação quântica para Deus?
Goswami: Na nova
ciência, Deus é o agente causal. Interações materiais produzem
possibilidades para (Deus) a consciência escolhê-las. A Física Quântica
diz que Deus é uma questão científica porque a questão é se Deus tem
poder causal. Nessa disciplina temos essas possibilidades quânticas que
são previstas pela matemática, mas nossas possibilidades de mudança na
realidade, por outro lado, não são previstas pela matemática. A questão
que surge é como isso acontece, porque isso de fato acontece.
Em cada observação, em cada experimento, nunca vemos
possibilidades, mas eventos nas nossas experiências. Essa é uma questão
de Deus. Existe alguma outra causação além da causação material? Esse
Deus não é um Deus da tradição religiosa popular, ele é baseado em
teoria, em tradições filosóficas espirituais. Por que não admitir que
existe uma tradição que essa nova ciência está redescobrindo? A cada
momento temos fenômenos que não têm interações materiais, e isso pode
ser identificado porque eles têm características de não sinal, não
localidade, há uma descontinuidade. Qualquer causação que não é material
pode ser chamada dessa maneira.
É uma questão de se acreditar?
Goswami: Não é
fé, porque temos teoria e tecnologia para prová-la. É como a
eletricidade, você não pode ver, mas está ali. Temos teorias,
experimentos datados e tecnologia científica na base dessa nova ciência.
Tecnologia que está curando pessoas, que nos dá uma nova fonte de
energia que não a material e que pode ser economicamente usada, e que já
é utilizada.
No mundo das humanidades, quem você acha que chegou perto de fazer essa ponte entre ciência e espiritualidade?
Goswami: O
psicólogo Carl Jung chegou bem perto. Os psicólogos já propuseram essa
metafísica espiritual para algumas práticas psicológicas, o que eles
chamam de Psicologia Transpessoal. Eles estão em sincronia com a nova
visão quântica. E também a medicina alternativa, mas o poder
estabelecido impede que essas técnicas sejam ensinadas no ensino da
Medicina tradicional. Porém, existem muitas instituições de medicina
alternativa que ensinam no mundo todo e estão produzindo conteúdo.
Biologia também vai responder às mudanças porque há fatos que o
darwinismo não pode explicar.
Na Psicologia, como essa troca pode ajudar a explicar alguns fenômenos?
Goswami: Na
Psicologia está uma das maiores aplicações dessa nova Ciência. Na
Psicologia Transpessoal temos a metafísica, eles corretamente avançaram
no sentido de considerar a consciência como a base do ser humano. Mas a
metafísica não tem base científica no sentido que a Psicologia Transpessoal aborda. A Física Quântica está dando as bases científicas
para essa disciplina. Sigmund Freud introduziu o conceito de
'inconsciente' e esse termo é usado amplamente em terapia, mas ainda não
há bases científicas para comprová-lo. Em ciência materialista, a
Psicanálise é denominada de psicologia vodu. Mas pudemos desde o começo
explicar a distinção entre consciência e inconsciência, e isso deu um
impulso para a Psicanálise, para as teorias de Jung, para a Psicologia
de forma geral, e definitivamente para a Psicologia Transpessoal.
Como suas teorias contribuíram para o desenvolvimento de temas da Psicologia?
Goswami: A nova
Ciência está me ajudando a integrar ramos e conceitos da Psicologia. Por
exemplo, interno e externo, Psicologia Convencional e Psicologia
Transpessoal. São coisas difíceis de fundamentar partindo puramente de
um ponto de vista psicológico.
Como a cura quântica pode ajudar a Psicologia?
Goswami: Esse é outro exemplo de como conceitos da Física Quântica são cruciais para entender a relação de cura entre mente e corpo.
Quando escuto você falar em
consciência coletiva penso sobre as chamadas mídias socias como Facebook
e twitter. Você já analisou o fenômeno da mídia social à luz da sua
teoria?
Goswami: No
mínimo, seremos capazes de utilizar a conexão local para provocar a
consciência não local, quando necessário. Essas mídias poderiam ter um
componente de coletividade. A interconexão está crescendo em um senso
local, mas no futuro seremos capazes de usar esse gatilho local para
alcançar consciência não local. Estou estudando sobre o tema. Talvez,
com essas comunidades, possamos inventar um tipo de conceito e com mais
compreensão fazer nossas interações se tornarem reais e acessar
consciência não local de um modo coletivo. A internet trouxe algumas
esperanças, mas temos que saber como materializá-las.
Você sempre usa a palavra 'sutil' nas suas entrevistas e escritos. Existe uma falta de sutileza para entender o mundo?
Goswami: Não, eu
quero dizer isso mais literalmente. As experiências sutis que temos são
verdadeiramente sutis. Por exemplo, elas são privadas. Nossas
experiências intuitivas são tão sutis que apenas temos tempo para fazer a
representação mental delas quando somos conscientes delas. Temos três
compartimentos das nossas experiências internas: sentimento, pensamento e
intuição, esses três juntos formam o corpo sutil, e temos o corpo
físico.
As teorias de William James sobre consciência influenciaram seu trabalho de alguma maneira?
Goswami: Eu não havia lido James até depois que eu escrevi O Universo Autoconsciente.
Conte um pouco sobre sua aproximação com o psiquiatra tcheco Stan Grof, um dos pioneiros da Psicologia Transpessoal.
Goswami: Fico
muito feliz em contar que em uma conferência recente sobre Psicologia
Transpessoal em Moscou, enquanto escutava as ideias dele mais uma vez,
elas iluminaram em minha mente a maneira como integrar o trabalho dele à
corrente principal da Psicologia. Estou escrevendo um artigo sobre o
tema. Eu e ele temos algumas ideias paralelas, ele sempre foi muito
receptivo em relação ao meu trabalho no sentido de que podemos integrar a
Psicologia à Ciência, da maneira que estamos desenvolvendo. O trabalho
dele está contribuindo para o desenvolvimento do ser humano porque a
nova ciência jogou nova luz sobre a sua teoria. Experiências do tipo
pré-natal e perinatal. Através dessas experiências é possível descobrir
aspectos da viagem de reencarnação, e a nova Física pode validá-las.
Esse é um aspecto interessante do trabalho de Grof.
Alguns estão rotulando a época em que
vivemos com a "era da ansiedade". Qual é o estudo do "doutor quântico"
ou do "psicólogo quântico" sobre esse fenômeno?
Goswami: Emoções
negativas de maneira geral, não só a ansiedade, são o nosso maior
problema. Minha solução é tentar fazer circuitos emocionais positivos em
massa. De acordo com a nova teoria baseada na ideia do biólogo e
pesquisador da telepatia, Rupert Sheldrake, de campos não locais
morfogenéticos, esses circuitos podem ser herdados por toda a humanidade
em poucas gerações.
Na sua visão, o que é a mente? Memórias, Sentimentos?
Goswami: 'Mente' é
o nome que comumente as pessoas usam para o local onde se armazena
nossas experiências internas. Memórias são mais do que o que é
armazenado no cérebro. Existem componentes não locais disso que ajudam a
explicar a reencarnação. E sentimento vem das nossas experiências de
movimentos de energia vital. A nova Ciência distingue dois aspectos da
mente. Um é a consciência, que é o grande terreno da existência onde
matéria e mente existem. Dizemos que matéria é a experiência externa e a
mente é a interna. Ao mesmo tempo, também reconhecemos que esse é o
sentido geral do que seja a mente, mas também o específico do termo.
Reconhecemos também que a mente mais amplamente pode ser classificada em
três aspectos.
Um deles é como energia, chamado de energia vital. Depois vem o
que podemos chamar de pequena mente, que é pensamento, sentido. E a
terceira pode ser chamada de supramental porque é dada no contexto do
pensamento, é a ideia de onde nossos valores vêm, de onde intuímos. Só
acessamos a região supramental por meio da intuição, ou seja, temos uma
intuição e fazemos a representação dela em pensamento. É melhor se
fizermos essa distinção.
Como o Brasil e a sua cultura podem contribuir para o desenvolvimento do seu trabalho?
Goswami:
Bastante. Em 1996, quando eu apresentei pela primeira vez meu trabalho
para o público brasileiro, a resposta emocional realmente me tocou e
soube que o País é importante para o meu trabalho. Estamos realmente
indo adiante com o movimento do ativismo quântico no Brasil, que é um
país único atualmente, muito parecido com a Índia de alguma maneira,
porque as emoções ainda são valorizadas no Brasil. Um dos grandes
problemas dos países ocidentais é de serem muito racionais.
Quando uma sociedade se torna muito racional ela não valoriza
sentimento e também intuição. Não reconhecendo a emoção, não podemos
lidar com as emoções negativas. Ninguém pode evitar emoções negativas
porque são instintivas, nós as seguimos sem sabê-lo. Apesar da
racionalidade do ocidente, a violência continua. Por quê? Somos guiados
pelas emoções. A economia montada no ocidente, especialmente nos EUA, é
um exemplo de como emoções negativas podem ser dispensáveis, como a
ganância... Dessa maneira, fica claro que superestimar a racionalidade é
um erro.
Um certo declínio dos valores
ocidentais, reflexo da crise econômica de 2008, poderá fazer com que seu
trabalho seja mais conhecido?
Goswami: Sim. As
condições da crise estão só piorando até que nós mudemos nossa visão de
mundo do materialismo científico para o idealismo monista. Repito,
consciência é a base de todo ser humano.
Ainda sobre a crise econômica. A desorientação das finanças mundiais contribuiu para a mudança de modelos e padrões?
Goswami: Os
modelos não foram trocados ainda, mas sim a consciência de que o
capitalismo, como está estabelecido, próximo do modelo de filosofia do
cientificismo materialista, não funciona, falhou. Esse capitalismo não é
mais o original proposto por Adam Smith. Esse sistema é caracterizado
por algumas ideias da Ciência materialista, como transformar a Economia
em matemática. É uma péssima ideia, você nunca pode precisar o porquê da
decisão de uma pessoa em comprar um produto. É completamente irracional
fundamentar isso por meio da matemática. Esses são alguns erros que
devem ser corrigidos. Eu já propus a Economia Espiritual, e gostaria de
contribuir para solucionar o problema.
E como funcionaria essa nova modalidade de capitalismo?
Goswami: A ideia é
simples. Há muito tempo eu reconheci que as necessidades dos seres
humanos são mais do que materiais. Esse capitalismo atual foi
estabelecido para satisfazer as necessidades materiais. Precisamos
estender esse sistema para incluir como valores, necessidades mais
elevadas, energia vital, necessidades de sentido mental, e até
necessidades intuitivas. Quando fazemos isso estamos espiritualizando a
Economia.
Tendo em vista as teorias defendidas
por você, seria possível um Amit Goswami ter aparecido num país
ocidental? Digo isso por causa da tradição espiritual do seu país de
origem.
Goswami: Acredito
que cedo ou tarde alguém descobriria a base espiritual da Ciência. As
coisas estão mudando, o oriente está ficando mais materialista e o
ocidente mais espiritual. O sempre acreditou em intuição.
Espiritualidade aparece através da intuição, e sempre acreditamos [os
orientais] na intuição, porque experiências intuitivas dão crédito aos
experimentos. Nunca tivemos problemas com a espiritualidade. O ocidente,
por outro lado, sempre foi cético em relação a esse tipo de
experiência. O que satisfaz a mente ocidental é a possibilidade de provar
uma teoria por meio de um experimento.
O ocidente foi cético sobre a espiritualidade até agora porque
ela não pode ser certificada por meio de testes. Mas agora as teorias
sobre Deus e espiritualidade são verificáveis e podem ser desenvolvidas
tecnologias a partir dessa base.
Qual foi a sua maior dificuldade para dar o passo na direção do pensamento de caráter espiritual, já que você era materialista?
Goswami: Minha grande dificuldade foi abandonar a crença materialista de que a consciência é um fenômeno do cérebro.
Qual foi o motivo da sua mudança para uma abordagem mais espiritual?
Goswami: Minha
visão de mundo foi totalmente invertida em um salto quântico de
criatividade. Fui materialista por muito tempo. Estava dando uma
conferência sobre Física Nuclear e não sentia que estava fazendo um bom
trabalho, as outras apresentações eram melhores do que a minha, eu
estava insatisfeito com o meu desempenho e sentia inveja da performance
dos outros. Aquela energia foi esmagadora. Percebi que tinha uma
desconexão entre o jeito em que eu vivia e o jeito que ganhava a vida.
Eu quis reintegrar a minha vida. Fui procurar e descobri afortunadamente
a nova metafísica para fazer Ciência.
O que você diria para um cético que, apesar de ter lido toda esta entrevista, não acredita nas suas teorias?
*Marcelo Galli é jornalista e colabora com esta publicação.
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