Por Maria Irene Maluf* no Portal Ciência & Vida, aqui.
Ainda que seja um desejo ancestral de toda mãe evitar que seus filhos
sofram, tanto a frustração quanto o perder fazem parte da maturação
emocional e cognitiva do Ser Humano. Apenas nesse processo é que se
aprende, paulatinamente, a superar os danos causados por rompimentos de
maior ou menor magnitude, reversíveis ou não, que ocorrem com todas as
pessoas: mas essa é uma das lições mais difíceis em qualquer idade e que
levamos a vida toda tentando assimilar e aceitar.
É comum vermos os pais se esforçando para proteger seus filhos e,
às vezes, até com grande exagero, pois muitas são as pessoas adultas
que têm dificuldades acentuadas de lidar com as próprias perdas. E como
assistir o sofrimento dos que tanto amamos é imensamente doloroso,
exemplos desse empenho são frequentemente vistos no dia a dia.
Os aprendizados que assimilamos, ao longo de nosso crescimento,
sejam de que ordem forem, são de fundamental importância, não apenas
para promover a aquisição de novos conhecimentos e comportamentos, mas
também para nos preparar física, mental, emocional e socialmente, para
nos tornarmos autônomos e capazes de vencer os revezes da vida com maior
dignidade e equilíbrio, sem perder a autoestima e sem precisar adentrar
ao mundo das compensações fáceis e, terrivelmente, perigosas na
adolescência, principalmente.
Viver e crescer trazem, necessariamente, novos aprendizados:
hoje, ninguém é igual ao que foi ontem ou será amanhã; perdemos pedaços
de nós nas experiências diárias e vamos nos transformando para
permanecermos fiéis a nós mesmos. Afinal, nosso cérebro não para nunca, e
nas trocas com o ambiente é que aprendemos e mudamos. Seja perdendo ou
ganhando, sempre estamos em um ciclo vital de transformação.
Mas é no câmbio de informações, com o mundo ao nosso redor, por
meio da interação com as outras pessoas e situações mais ou menos
favoráveis, enfrentando desafios e dificuldades de diferentes ordens,
que aprendemos as duas lições mais singularmente difíceis: optar e
perder. Fazer escolhas tem um significado especial para nós, humanos,
pois somos dotados de raciocínio e consciência e, desde cedo, nos
frustramos por perceber que de uma opção sempre decorrem inevitáveis
danos.
Aprendemos, desde crianças, a pensar em termos de pequenas (ou
grandes) compensações às frustrações, que, se não nos dão uma satisfação
absoluta, ao menos nos permitem lidar, com menor sofrimento, com as
situações adversas do dia a dia.
NEM SEMPRE A MORTE,
EMBORA IRREVERSÍVEL, CONSTITUI A MAIOR DE TODAS AS DORES. PERDER PODE
TER SIGNIFICADOS MÚLTIPLOS E DIVERSOS PARA AS PESSOAS.
Quando falamos em perdas, logo nos vem à mente o luto. Mas nem
sempre a morte, embora irreversível, constitui a maior de todas as
dores. Perder pode ter significados múltiplos e diversos para as
pessoas, conforme as situações vividas e as diferentes idades, já que as
conotações culturais são, também, variadas.
As perdas sofridas durante a vida, especialmente ocorridas na
infância, são, em geral, muito pontuais e, embora menos frequentes do
que as que nos assolam mais tarde, são, de modo geral, abrangentes e
marcam a pessoa por toda a vida. Ou seja, embora boa parte das perdas
sofridas, no período inicial da vida, seja praticamente superável, a dor
sentida nem sempre é esquecida ou superada facilmente, pois trata-se de
uma época de elaboração, de crescimento pessoal e, desde a destruição
de um brinquedo, a perda de um lugar privilegiado na família, assim como
o fim do convívio com amiguinhos queridos, com um dos pais, ou um bicho
de estimação, que morre, a mudança de escola, a repetência do ano
letivo, tudo isso é vivenciado pelas crianças como algo novo que pode
ser assustador.
Entretanto, se não houver um adulto com quem se vinculem bem e
que lhes garanta segurança afetiva, mesmo as frustrações às pequenas
expectativas das crianças, geralmente pouco embasadas na realidade,
podem causar danos, por vezes irreparáveis. É claro que, se de um lado
podemos procurar evitar prejuízos desnecessários, de outro, não os
podemos suprimir totalmente, pois fazem parte do amadurecimento e
fortalecimento pessoal para futuros e inevitáveis rompimentos, entre o
desejo e a realidade da vida, e que sempre ocorrerão em maior ou menor
número e intensidade.
O que os pequenos ganham com as perdas é uma lição para o futuro e
esse aprendizado pode ocorrer na realidade diária, ou mesmo por meio de
jogos e brincadeiras. Saber escolher, optar, perder e até ganhar
constituem uma série de processos lentos de aprendizado, que, mesmo não
ocorrendo apenas na escola, também dizem respeito a ela, pois facilitam a
aquisição de conhecimentos acadêmicos, do momento que crianças mais
seguras pensam com mais clareza e, assim, se dedicam melhor à
aprendizagem formal.
Deixar os filhos vivenciarem seus lutos dentro dos limites que
podem suportar, dando-lhes apoio emocional e acolhimento, é o melhor que
se pode fazer diante de dois momentos inevitáveis da vida: aprender a
optar e a perder. É dessa forma que os pais podem, realmente, auxiliar
seus filhos a superar e enfrentar novos desafios: oferecendo apoio
afetivo, mas tratando do assunto como uma forma natural de prática para a
vida.
*Maria Irene Maluf é especialista em Psicopedagogia, Educação Especial e
Neuroaprendizagem. Foi presidente nacional da Associação Brasileira de
Psicopedagogia – ABPp (gestão 2005/07). É editora da revista
Psicopedagogia da ABPp e autora de artigos em publicações nacionais e
internacionais. Coordena curso de especialização em Neuroaprendizagem. irenemaluf@uol.com.br
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