Introdução

Há muito o que ser aprendido. Há muito o que podemos extrair do que vemos, tocamos, ouvimos, e acima de tudo, sentimos. Nossa sabedoria vem dos retalhos que vamos colhendo ao longo de nossa evolução, que os leva a formar a colcha que somos. Esse espaço é para que eu possa compartilhar das luzes que formam o que Eu tenho sido!!!

sábado, 24 de outubro de 2015

O QUE É VIRTUDE?

A virtude, no mais alto grau, é o conjunto de todas as qualidades essenciais que constituem o homem de bem. Ser bom, caritativo, laborioso, sóbrio, modesto, são qualidades do homem virtuoso.[1]



A eterna busca do ser humano foi, é, e sempre será, a felicidade.

Esse bem supremo é desejado desde todos os tempos.

Os grandes filósofos da antiguidade estavam convencidos de que uma vida feliz só se consegue com a prática das virtudes. Alguns filósofos modernos também chegaram a essa conclusão.

Mas o que é uma virtude, afinal?

Encontraremos várias correntes de pensamentos definindo o que são virtudes, mas há um consenso em torno de que sem virtude não pode haver uma vida feliz.

A palavra virtude é derivada da língua grega, de um termo que significava força, poder.[2]

Assim, podemos dizer que uma virtude é uma força da alma, um poder, uma excelência. Pode-se ter um grande talento para as artes, e ser forte nessa área.

Dizemos que um excelente músico é um virtuoso, pois sua força está nessa especialidade.

Ocorre que podemos ser fortes intelectualmente ou fisicamente, e usar todos esses poderes, ou forças, e ainda assim permanecermos infelizes, o que prova que  essas virtudes não são suficientes para nossa felicidade.

Segundo os grandes pensadores, a virtude necessária para a conquista da felicidade é a virtude moral. Trata-se, sim, de uma força, de um poder, mas é de um poder que deverá ser exercido sobre si mesmo, sobre seus vícios, suas más tendências.

Dessa forma, o homem que deseja conquistar virtudes está sempre disposto a empreender esforços constantes para fazer o bem e evitar o mal, porque sabe que sua má conduta lhe trará sofrimentos.

E como se conseguirá isso?

O primeiro passo é o autoconhecimento. Sem o autoconhecimento não há como empreender um esforço eficaz, uma vez que não se sabe por onde começar. Conhecendo-se, o homem detecta suas forças e suas fraquezas, e poderá criar estratégias para fortalecer o que é bom e eliminar o que é mau.

Para quem nunca se deteve nessa análise de si mesmo, os primeiros passos são sempre difíceis, mas com a persistência se chega lá.

Opa! Já falamos aqui de uma virtude: a persistência.

As virtudes são inumeráveis e estão interligadas entre si, como uma rede. Assim, quando se empenha esforço na conquista de uma, automaticamente outras serão adquiridas como consequência.

Um segundo passo é buscar conhecer seus piores inimigos: os vícios.

Podemos adiantar, desde logo, que o pai de todos os vícios é o orgulho.

Se você algumas vezes se deixa dominar pelo ódio, pelo ciúme, pela inveja, a mágoa, a impaciência, a intolerância, quem está no comando de sua vida é esse poderoso vício chamado orgulho.

O orgulho é uma imagem falsa que o homem faz de si mesmo, geralmente alimentada desde a infância, o que favorece o surgimento do egoísmo, que está na raiz de todos os males da humanidade, de todos os males sociais.

A virtude contrária ao orgulho é a humildade. Ela é necessária para se começar a desenvolver as demais, pois o humilde parte sempre do princípio: “posso estar enganado”, enquanto o orgulhoso é sempre senhor de si, e julga ser o único detentor da verdade.

Jesus foi o maior exemplo de humildade e Pilatos o de orgulho. A humildade é a virtude dominante em todos os homens de bem que passaram pela Terra.

Sócrates, Confúcio, Buda, Gandhi, e outros tantos, eram humildes.

A humildade muitas vezes é confundida com sujeição, passividade, desleixo, miséria, e por isso tida como uma qualidade dos fracos.

No entanto, Jesus ensinou e viveu essa virtude com maestria, e hoje, mais do que nunca, se reconhece o seu grande valor intelecto-moral.

É certo que precisamos admitir que ainda estamos longe de ser como Jesus, mas isso quer dizer que não possuímos nenhuma virtude?

Oh, não! Há virtude sempre que há resistência voluntária ao arrastamento dos maus pendores.[3]

Assim, desde que se faça um esforço para evitar uma má ação, há uma virtude moral.

O esforço deve ser voluntário e não forçado pelas circunstâncias ou pela falta de coragem. Se tudo for favorável para efetivar a ação e a ela se resistir, então está caracterizada a virtude.

Considerando que o bem mais valioso, desejado por todos aqueles que buscam a felicidade, é a liberdade, e não se pode ser livre quando se é dominado pelos vícios ou pelas paixões, então nossa intenção é buscar um conhecimento que nos ajude nessa busca.

Trataremos, portanto, das principais virtudes, em pequenos textos, para que tenhamos uma noção sobre essas forças morais que, se bem utilizadas, nos garantirão a tão sonhada felicidade.

Encerramos em esta intrigante frase de Sócrates:

“A um homem bom não é possível que ocorra nenhum mal, nem em vida, nem em morte.” 


[1] E.S.E, cap. XVII, item 8.

[2] A palavra virtude vem do termo grego arete, traduzida pelo latinos como virtus, cujo radical vis significa poder, força.

[3] O Livro dos Espíritos, item 893.

Fonte: http://www.filosofianoar.com.br

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

A PENTECOSTE


(GRUPO DE SAINTE-GEMME -TARN - Médium: SR. C...)

O Espírito de Deus sopra sobre o mundo, a fim de regenerar os seus filhos. Se, como ao tempo dos apóstolos, não se mostra sob a forma de línguas de fogo, não está menos realmente presente entre vós. Orai, pois, com fervor ao Todo-Poderoso, a fim de que ele se digne fazer-vos tirar proveito de todas as vantagens morais, de todos os dons imperecíveis que ele então houve por bem derramar sobre a cabeça dos apóstolos e do Cristo. Pedi e recebereis, e nada do que pedirdes de bom e útil para o vosso progresso espiritual vos será recusado. Mais uma vez, orai com fervor, mas que seja o vosso coração que fale, e não os lábios; ou se os vossos lábios se agitarem, que digam apenas o que o coração houver pensado. A felicidade que sentireis quando estiverdes animados pelo espírito de Deus será tão grande que não podereis fazer ideia. Depende de vós obtê-la. E, a partir desse momento, considerareis os dias que restam como um pedaço de caminho a percorrer para chegardes ao destino e onde encontrareis, no fim do dia, a vossa ceia e um abrigo para a noite.

Mas que aquela pouca importância relativa que deveis ligar às coisas terrenas não vos impeça de considerar os vossos deveres materiais como muito sérios. Aos olhos de Deus cometeríeis grave falta se não vos entregásseis conscientemente aos vossos deveres cotidianos. Nada se deve desprezar do que saiu das mãos do Criador. Deveis, em certa medida, desfrutar os bens materiais que vos foram concedidos. Vosso dever é não guardá-los exclusivamente para vós, mas fazer deles partilharem os irmãos aos quais eles foram recusados. Uma consciência pura, uma caridade e uma humildade sem limites, eis a melhor das preces para chamar a si o Espírito Santo. É o verdadeiro Veni Creator, não que este cantado nas igrejas não seja uma prece que será exalçada, sempre que feita de bom coração, mas, como já vos foi dito tantas vezes, o fundo é tudo, a forma quase nada.

Então pelos atos pedi que o Espírito Santo venha visitar-vos e derramar em vossa alma essa força que dá a fé para superar as misérias da existência terrena e para estender a mão àqueles dos vossos irmãos a quem a fraqueza de espírito impede de ver a luz, sem a qual só marchareis tateantes, com o risco de vos chocardes com todos os obstáculos semeados no caminho. A verdadeira felicidade, pela qual todos suspirais, lá se acha. Cada um a tem sob a mão. Basta querer para alcançá-la.

Tomai hoje resoluções firmes e boas, e o Espírito de Deus não vos faltará, tende certeza. Amai ao vosso próximo como a vós mesmos, por amor a Deus, e tereis dignamente solenizado o dia em que o Espírito Santo veio visitar os apóstolos do Cristianismo.

HIPPOLYTE FORTOUL

(Revista Espírita, agosto de 1862 - Dissertações espíritas)

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

O DINHEIRO

“711. O uso dos bens da Terra é um direito de todos os homens?
          “Esse direito é conseqüente da necessidade de viver. Deus não imporia um dever sem dar ao homem o meio de cumpri-lo.”

          715. Como pode o homem conhecer o limite do necessário?
          Aquele que é ponderado o conhece por intuição. Muitos só chegam a conhecê-lo por experiência e à sua própria custa.”

“O Livro dos Espíritos”




De fato, o dinheiro constitui pesada responsabilidade para o seu possuidor.
Não compra a felicidade e muitas vezes torna-se responsável por incontáveis desditas.
Apesar disso, a sua ausência quase sempre se transforma em fator de desequilíbrio e miséria com que se atormentam multidões em desvario.
O dinheiro, em si mesmo, não tem culpa: não é bom nem mau.
A aplicação que se lhe dá, torna-o agente do progresso social, do desenvolvimento técnico, do conforto físico e, às vezes, moral, ou causa de inomináveis desgraças.
Sua validade decorre do uso que lhe é destinado.
Com ele se adquire o pão, o leite, o medicamento, dignificando o homem pelo trabalho.
Sua correta aplicação impõe responsabilidade e discernimento, tornando-se fator decisivo na edificação dos alicerces das nações e estabilizando o intercâmbio salutar entre os povos.
Através dele irrompem o vício e a corrupção, que arrojam criaturas levianas em fundos despenhadeiros de loucura e criminalidade.
Para consegui-lo, empenham-se os valores da inteligência, em esforços exaustivos, por meio dos quais são fomentados a indústria, o comércio, as realizações de alto porte, as ciências, as artes, os conhecimentos.
No sub-mundo das paixões, simultaneamente, dele se utilizando, a astúcia e a indignidade favorecem os disparates da emoção, aliciando as ambições desregradas para o consórcio da anarquia com o prazer.
Por seu intermédio, uns são erguidos aos píncaros da paz, da glória humana, enquanto outros são arrojados às furnas pestilentas do pavor e da desagregação moral em que sucumbem.
Sua presença ou ausência é relevante para a quase totalidade dos homens terrenos.
Para o intercâmbio, no movimento das trocas de produtos e valores, o dinheiro desempenha papel preponderante.
Graças a ele estabelecem-se acordos de paz e por sua posse explodem guerras calamitosas.

***

Usa-o sem escravizar-te.
Possui-o sem deixar-te por ele possuir.
Domina-o antes que te domine.
Dirige-o com elevação, a fim de que não sejas mal conduzido.
Mediante sua posse, faze-te pródigo, sem te tornares perdulário.
Cuida de não submeter tua vida, teus conceitos, tuas considerações e amizades ao talante do seu condicionamento.
Previdente, multiplica-o a benefício de todos, sem a avareza que alucina ou a ambição que tresvaria.
De como te servires do dinheiro, construirás o céu da alegria ou o inferno de mil tormentos para ti mesmo.

***

Se te escasseia nas mãos a moeda, não te suponhas vencido.
Ter ou deixar de ter, importa pouco, na economia moral da tua existência.
O importante será a posição que assumas em relação à posse.
Não te desesperes pela ausência do dinheiro.
Como há aqueles que se fizeram servos do que têm, os há, também, escravizados ao que gostariam deter.
O dinheiro é meio, não meta. Imprescindível colocar-te jubilosamente na situação que a vida te brindou, padronizando as diretrizes e os desejos pessoais dentro dos limites transitórios da experiência educativa por que passas, conseqüência natural do mau uso que fizeste do dinheiro que um dia possuíste.
Por outros recursos poderás ajudar o próximo e erigir a felicidade pessoal, conforme as luminosas lições com que o Evangelho te pode enriquecer a vida.
Essencial é viver bem e em paz com ou sem o dinheiro.

Joanna de Ângelis (Espírito), através de Divaldo Pereira Franco, livro: Leis Morais da Vida.

EXISTÊNCIA DE DEUS

Capítulo II - Deus 


1. Sendo Deus a causa primária de todas as coisas, a origem de tudo o que existe, a base sobre que repousa o edifício da criação, é também o ponto que importa consideremos antes de tudo.

2. Constitui princípio elementar que é pelos seus efeitos que se julga uma causa, mesmo quando ela se conserve oculta.

Se, fendendo os ares, um pássaro é atingido por mortífero grão de chumbo, deduz-se que hábil atirador o alvejou, ainda que este último não seja visto. Nem sempre, pois, se faz necessário vejamos uma coisa, para sabermos que ela existe. Em tudo, observando os efeitos é que se chega ao conhecimento das causas.

3. Outro princípio igualmente elementar e que, de tão verdadeiro, passou a axioma é o de que todo efeito inteligente tem que decorrer de uma causa inteligente.

Se perguntassem qual o construtor de certo mecanismo engenhoso, que pensaríamos de quem respondesse que ele se fez a si mesmo? Quando se contempla uma obra-prima da arte ou da indústria, diz-se que há de tê-la produzido um homem de gênio, porque só uma alta inteligência poderia concebê-la. Reconhece-se, no entanto, que ela é obra de um homem, por se verificar que não está acima da capacidade humana; mas, a ninguém acudirá a ideia de dizer que saiu do cérebro de um idiota ou de um ignorante, nem, ainda menos, que é trabalho de um animal, ou produto do acaso.

4. Em toda parte se reconhece a presença do homem pelas suas obras. A existência dos homens antediluvianos não se provaria unicamente por meio dos fósseis humanos: provou-a também, e com muita certeza, a presença, nos terrenos daquela época, de objetos trabalhados pelos homens. Um fragmento de vaso, uma pedra talhada, uma arma, um tijolo bastarão para lhe atestar a presença. Pela grosseria ou perfeição do trabalho, reconhecer-se-á o grau de inteligência ou de adiantamento dos que o executaram. Se, pois, achando-vos numa região habitada exclusivamente por selvagens, descobrirdes uma estátua digna de Fídias, não hesitareis em dizer que, sendo incapazes de tê-la feito os selvagens, ela é obra de uma inteligência superior à destes.

5. Pois bem! lançando o olhar em torno de si, sobre as obras da Natureza, notando a providência, a sabedoria, a harmonia que presidem a essas obras, reconhece o observador não haver nenhuma que não ultrapasse os limites da mais portentosa inteligência humana. Ora, desde que o homem não as pode produzir, é que elas são produto de uma inteligência superior à Humanidade, a menos se sustente que há efeitos sem causa.

6. A isto opõem alguns o seguinte raciocínio:

As obras ditas da Natureza são produzidas por forças materiais que atuam mecanicamente, em virtude das leis de atração e repulsão; as moléculas dos corpos inertes se agregam e desagregam sob o império dessas leis. As plantas nascem, brotam, crescem e se multiplicam sempre da mesma maneira, cada uma na sua espécie, por efeito daquelas mesmas leis; cada indivíduo se assemelha ao de quem ele proveio; o crescimento, a floração, a frutificação, a coloração se acham subordinados a causas materiais, tais como o calor, a eletricidade, a luz, a umidade, etc. O mesmo se dá com os animais. Os astros se formam pela atração molecular e se movem perpetuamente em suas órbitas por efeito da gravitação. Essa regularidade mecânica no emprego das forças naturais não acusa a ação de qualquer inteligência livre. O homem movimenta o braço quando quer e como quer; aquele, porém, que o movimentasse no mesmo sentido, desde o nascimento até a morte, seria um autômato. Ora, as forças orgânicas da Natureza são puramente automáticas.

Tudo isso é verdade; mas, essas forças são efeitos que hão de ter uma causa e ninguém pretende que elas constituam a Divindade. Elas são materiais e mecânicas; não são de si mesmas inteligentes, também isto é verdade; mas, são postas em ação, distribuídas, apropriadas às necessidades de cada coisa por uma inteligência que não é a dos homens. 

A aplicação útil dessas forças é um efeito inteligente, que denota uma causa inteligente. Um pêndulo se move com automática regularidade e é nessa regularidade que lhe está o mérito. É toda material a força que o faz mover-se e nada tem de inteligente. Mas, que seria esse pêndulo, se uma inteligência não houvesse combinado, calculado, distribuído o emprego daquela força, para fazê-lo andar com precisão? Do fato de não estar a inteligência no mecanismo do pêndulo e do de que ninguém a vê, seria racional deduzir-se que ela não existe? Apreciamo-la pelos seus efeitos.

A existência do relógio atesta a existência do relojoeiro; a engenhosidade do mecanismo lhe atesta a inteligência e o saber. Quando um relógio vos dá, no momento preciso, a indicação de que necessitais, já vos terá vindo à mente dizer: aí está um relógio bem inteligente?

Outro tanto ocorre com o mecanismo do Universo: Deus não se mostra, mas se revela pelas suas obras.

7. A existência de Deus é, pois, uma realidade comprovada não só pela revelação, como pela evidência material dos fatos. Os povos selvagens nenhuma revelação tiveram; entretanto, creem instintivamente na existência de um poder sobre-humano. Eles vêem coisas que estão acima das possibilidades do homem e deduzem que essas coisas provêm de um ente superior à Humanidade. Não demonstram raciocinar com mais lógica do que os que pretendem que tais coisas se fizeram a si mesmas? 


LACORDAIRE E AS MESAS GIRANTES

Extrato de uma carta do abade Lacordaire à Sra. Swetchine, datada de Flavigny, 29 de junho de 1853, tirada de sua correspondência publicada em 1865.

"Vistes girar e ouvistes falar das mesas? 

- Desdenhei vê-las girar, como uma coisa muito simples, mas ouvi e fiz que elas falassem. Elas me disseram coisas muito admiráveis sobre o passado e sobre o presente. Por mais extraordinário que isto seja, é para um cristão que acredita nos Espíritos um fenômeno muito vulgar e muito pobre. Em todos os tempos houve modos mais ou menos bizarros para se comunicar com os Espíritos; apenas outrora se fazia mistério desses processos, como se fazia mistério da Química. A Justiça, por meio de execuções terríveis, enterrava essas estranhas práticas na sombra. Hoje, graças à liberdade dos cultos e à publicidade universal, o que era um segredo tornou-se uma fórmula popular. Talvez, também, por essa divulgação, Deus queira harmonizar o desenvolvimento das forças espirituais ao desenvolvimento das forças materiais, para que o homem não o esqueça, em presença das maravilhas da mecânica, que há dois mundos inseridos um no outro: o mundo dos corpos e o mundo dos Espíritos.

É provável que esse desenvolvimento paralelo continue crescendo até o fim do mundo, o que trará um dia o reino do Anticristo, onde se verá, de um lado e do outro, para o bem e para o mal, o emprego de armas sobrenaturais e prodígios pavorosos. Disto não concluo que o Anticristo esteja próximo, porque as operações que testemunhamos nada têm, salvo a publicidade, de mais extraordinário do que o que se via outrora. Os pobres incrédulos devem estar bastante inquietos com sua razão, mas eles têm o recurso de acreditar em tudo para fugir da verdadeira fé, e não falharão. Ó profundeza dos desígnios de Deus!"

O abade Lacordaire escrevia isto em 1853, isto é, quase no começo das manifestações, numa época em que esses fenômenos eram muito mais um objeto de curiosidade do que assunto de meditações sérias. Embora nessa época eles não se tivessem constituído em ciência nem em corpo de doutrina, ele tinha entrevisto sua importância e, longe de considerá-los como uma coisa efêmera, previa o seu desenvolvimento no futuro. Sua opinião sobre a existência e a manifestação dos Espíritos é categórica. Ora, como ele é tido, geralmente, por todo mundo, como uma das altas inteligências deste século, parece difícil colocá-lo entre os loucos, depois de havê-lo aplaudido como homem de grande senso e de progresso. Pode-se, portanto, ter senso comum e crer nos Espíritos.

Diz ele que as mesas falantes são “um fenômeno muito vulgar e muito pobre”; bem pobre, com efeito, quanto à maneira de comunicar-se com os Espíritos, porque se não se tivessem tido outros, o Espiritismo quase não teria avançado; naquele tempo, mal se conheciam os médiuns escreventes e não se suspeitava o que iria sair desse meio aparentemente tão pueril. Quanto ao reino do Anticristo, Lacordaire parece não se amedrontar muito, porque não o vê chegar tão depressa. Para ele, essas manifestações são providenciais; elas devem perturbar e confundir os incrédulos; nelas ele admira a profundeza dos desígnios de Deus; elas não são, pois, obra do diabo, que deve estimular a renegar Deus e a não reconhecer o seu poder.

O trecho acima, da correspondência de Lacordaire, foi lido na Sociedade de Paris, na sessão de 18 de janeiro; nessa mesma sessão o Sr. Morin, um de seus médiuns escreventes habituais, adormeceu espontaneamente sob a ação magnética dos Espíritos; era a terceira vez que nele se produzia esse fenômeno, pois habitualmente só adormece pela magnetização ordinária. Em seu sono ele falou sobre vários assuntos e de diversos Espíritos presentes, cujo pensamento nos transmitiu. Entre outras coisas disse o seguinte:

“Um Espírito que todos conheceis, e que também reconheço; um Espírito de grande reputação terrena, elevado na escala intelectual dos mundos, está aqui. Espírita antes do Espiritismo, eu o vi ensinando a doutrina, não mais como encarnado, mas como Espírito. Vi-o pregando com a mesma eloquência, com o mesmo sentimento de convicção íntima que quando vivo, o que não teria ousado pregar abertamente do púlpito, mas aquilo a que conduziam os seus ensinamentos. Vi-o pregar a doutrina aos seus, à sua família, a todos os seus amigos. Vi-o desesperar-se, embora em estado espiritual, quando encontrava um cérebro refratário ou uma resistência obstinada às inspirações que ele insuflava, sempre vivo e impetuoso, querendo fazer penetrar a convicção nas inteligências, como se faz penetrar na rocha viva o buril impulsionado por vigorosa martelada. Mas este não entra tão depressa; contudo, sua eloquência converteu vários. Este Espírito é o do abade Lacordaire.

“Ele pede uma coisa, não por orgulho, por um interesse pessoal qualquer, mas no interesse de todos e para o bem da Doutrina: a inserção na Revista do que ele escreveu há treze anos. Se peço tal inserção, diz ele, é por dois motivos: o primeiro porque mostrareis ao mundo que, como dizeis, pode-se não ser tolo e crer nos Espíritos, e o segundo é que a publicação dessa primeira citação permitirá que se descubram em meus escritos outras passagens que serão consideradas como concordes com os princípios do Espiritismo”.

(Revista Espírita, fevereiro de 1867)

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

SUGESTÃO DE LEITURA - O LIVRO DA SUA VIDA - OSHO


"[...] sempre que você encontra alguém, encontra um indivíduo. 'Sociedade' é só um nome coletivo - um só nome, não uma realidade -, sem nenhuma substância".

"O mundo conheceu pouquíssimos rebeldes. Mas agora é a hora: se a humanidade se provar incapaz de produzir um grande número de rebeldes, um espírito rebelde, os nossos dias na terra estão contados. Então as décadas vindouras podem se tornar a nossa sepultura. Estamos quase chegando a isso."

"A rebelião é uma descontinuidade. Não é reforma, não é revolução: você simplesmente se desliga de tudo o que é velho - as velhas religiões, as velhas ideologias políticas, o velho ser humano - tudo isso é velho, e você se desliga disso. Começa vida nova, da etapa zero."

"O revolucionário tenta mudar o que é velho; o rebelde simplesmente se afasta dele, como a cobra abandona a pele velha sem nunca olhar para trás."

"[...] a rebeldia é a qualidade essencial de uma pessoa religiosa. É a espiritualidade na sua forma mais pura."

"É estranho o modo como as revoluções fracassaram, fracassaram nas mãos dos próprios revolucionários, porque depois que assumem o poder eles passam a pensar de outras maneiras. Afeiçoam-se demais ao poder. Daí em diante, a sua única preocupação é encontrar meios de manter para sempre esse poder nas mãos e manter o povo sob o seu jugo."

A FILOSOFIA ESPÍRITA DA FÉ RACIOCINADA

As relações entre fé e razão desde o princípio fazem parte do debate filosófico espírita, com a criação por Allan Kardec do conceito de fé raciocinada. De um ponto de vista conceitual, estabelece-se uma contradição aparentemente insuperável, porquanto a fé se funda na convicção e a razão, na dúvida; resulta, então, que ambos se contradizem. Ora, como crer e duvidar são práticas antagônicas por definição, o conceito de "fé raciocinada", seria por isso um evidente contra-senso.

Em Kardec, esse conceito é apresentado dentro de um quadro argumentativo construído para negar uma outra noção, atribuída pelo professor lionês às religiões dogmáticas: a "fé cega". Nesse sentido, a fé raciocinada seria algo próximo de "fé fundamentada", isto é, o adjetivo referente ao raciocínio daria ao sujeito o significado de um estado, e não de um processo. Ou seja, a fé raciocinada não seria propriamente uma "fé que raciocina", e sim, uma fé que já raciocinou antes, para se constituir. Tal interpretação consegue parcialmente satisfazer o quadro lógico de separação entre fé e razão: haveria primeiro o movimento de raciocínio e, somente depois, a fé se constituiria.

Esse ponto de vista, entretanto, não é satisfatório, sob o prisma kardequiano. Ainda nas menções que faz sobre a questão da fé, o codificador publicou em "O Evangelho Segundo o Espiritismo" um axioma que se tornou famoso nos meios doutrinários espíritas: "Fé inabalável só é a que pode encarar a razão, face a face, em todas as épocas da Humanidade". Nessa proposição, Allan Kardec nos remete a uma percepção histórica, processual, do fenômeno da crença, delimitando, com o rigor que lhe era próprio, a característica especial e profundamente inovadora da fé espírita.

Nesse contexto, a fé raciocinada – qualidade que a tornaria inabalável – seria não apenas aquela que se constituísse por um movimento de decisão racional, mas, também, a que se mantivesse em regime de racionalidade contínua, inclusa essa exigência no exercício da própria fé. A conciliação necessária, nesse caso, entre os conceitos de fé e razão, seria feita pela mudança de um raciocínio lógico para um raciocínio dialético: os contrários, ao invés de se excluírem, se complementam, se conjugam, na explicação da realidade.

Dentro desse modo de pensar, a fé espírita forma um par dialético inseparável com a razão espírita. Tal ideia significa que a crença espírita é basicamente uma fé que admite dúvida e com ela convive, durante todo o tempo. Trata-se, pois, de uma fé aberta, dialogal, disposta a modificar as próprias opiniões ou o objeto de sua manifestação como crença, desde que satisfeitas as condições do livre exercício da razão. Em contrapartida, a razão espírita constitui uma dúvida que se baseia na fé, capaz de fazer emergir as desconfianças naturais da racionalidade sem uma pretensão cética ou cientificista, e que, sobretudo, está disposta a admitir a crença e a confiança naqueles conteúdos sobre os quais a razão ainda não assumiu uma postura de conhecimento e verificação. Tal composição resulta no que Herculano Pires denominou, muito apropriadamente, "fideísmo crítico".

O uso da razão é a admissão da dúvida, a qual, no Espiritismo, se funda no princípio filosófico da imperfeição espiritual (temos preferido denominá-la incompletude, para retirar o sentido pejorativo do termo "imperfeição", como algo "errado, estragado, com defeito"), o que faz da jornada espiritual a contínua e necessária possibilidade da mudança. Por esta via, o Espiritismo funda um novo iluminismo, cuja formulação acredita na racionalidade como fundamento da fé humana e, por tal razão, confia no aperfeiçoamento das possibilidades da razão como geratriz do aprimoramento da fé.

Feitas tais considerações, de ordem filosófica, convém refletir pragmaticamente. Nem todos os espíritas na atualidade compreendem o que significa essa dimensão do conceito de fé raciocinada. Não raro, imaginam que raciocinar seja o mesmo que racionalizar, isto é, referir-se à razão como pretexto para justificar o dogma, o que transforma o argumento racional em argumento ideológico (no sentido negativo, como falsa concepção da realidade, apoiada somente em critérios de identidade religiosa), atitude que de modo algum pode ser justificada na proposta de Kardec. Fé raciocinada, portanto, não é o mesmo que fé racionalizada (até porque todas as formas de fé podem ser enquadradas neste último tipo).

Dentre as diversas concepções de racionalidade válidas em filosofia, acreditamos que a noção de "razão comunicativa" ou "razão consensual", do filósofo alemão Jürgen Habermas, é a que melhor se adequa ao conceito de fé raciocinada, em Kardec. Para aquele pensador, há racionalidade sempre que houver diálogo onde se instaurem consensos entre os interlocutores, sendo que a verificação prática do consenso seria a própria demonstração de que houve racionalidade. Em outras palavras: razão é o diálogo que dá certo.

Em Kardec, a fé raciocinada é a fé que permanece em constante contato com a razão, isto é, busca sempre um saber mais amplo, argumenta e se questiona. Para isso, a fé espírita há de ser permanentemente reconstruída no diálogo com os diversos saberes, especialmente na interação entre o saber humano, de vertente científica, filosófica ou experiencial, e o saber espiritual, originado da interlocução mediúnica. Eis, portanto, sob formulação espírita, a razão comunicativa, um movimento de construção da crença erigido sobre o diálogo e, por isso, capaz de "enfrentar a razão, face a face, em qualquer época da Humanidade".

Os espíritas, por isso, não podem abandonar em tempo algum a possibilidade do diálogo, não apenas com os espíritos, a partir dos quais o conhecimento assume a forma de "revelação", em definição kardequiana, mas também com os variados saberes humanos, especialmente o filosófico e o científico. A fé espírita há de ser uma fé em constante atualização, uma fé sempre renovada, sempre reconstruída. Ou recairá lamentavelmente num novo tipo de fé cega: a que se contenta em apenas fingir que vê.

Luiz Signates (GO)

ORDENAÇÕES HUMANAS

"Sujeitai-vos, pois, a toda ordenação humana por amor do Senhor."
(1 Pd 2,13.)
Certos temperamentos impulsivos, aproximando-se das lições do Cristo, presumem no Evangelho um tratado de princípios destruidores da ordem existente no mundo. Há quem figure no Mestre um anarquista vigoroso, inflamado de cóleras sublimes.

Jesus, porém, nunca será patrono da desordem. A novidade que transborda do Evangelho não aconselha ao espírito mais humilhado da Terra a adoção de armas contra irmãos, mas, sim, que se humilhe ainda mais, tomando a cruz, a exemplo do Salvador.

Claro está que a Boa Nova não ensina a genuflexão ante a tirania insolente; entretanto, pede respeito às ordenações humanas, por amor ao Mestre Divino. 

Se o detentor da autoridade exige mais do que lhe compete, transforma-se num déspota que o Senhor corrigirá, através das circunstâncias que lhe expressam os desígnios, no momento oportuno. Essa certeza é mais um fator de tranqüilidade para o servo cristão que, em hipótese alguma, deve quebrar o ritmo da harmonia. 

Não te faças, pois, indiferente às ordenações da máquina de trabalho em que te encontras. É possível que, muita vez, não te correspondam aos desejos, mas lembra-te de que Jesus é o Supremo Ordenador na Terra e não te situaria o esforço pessoal onde o teu concurso fosse desnecessário.

Tens algo de sagrado a fazer onde respiras no dia de hoje. Com expressões de revolta, tua atividade será negativa. Recorda-te de semelhante verdade e submete-te às ordenações humanas por amor ao Senhor Divino.

Emmanuel (Espírito), através de Francisco Cândido Xavier, no Livro: Caminho, Verdade e Vida, capítulo 81.